Mauro Carrusca    

30/09/2015

“O cemitério está cheio de boas ideias!”

Esta é uma expressão que sempre uso em minhas palestras, conferências e aulas. Por quê?

Para entender isso, veremos que a inovação está ligada ao insight, ao ambiente, à criatividade, a um propósito, à colaboração e articulação e à aceitação do fracasso.

O Insight

O famoso insight ou inspiração aparece diferentemente para cada pessoa. Para uns, na leitura de um texto interessante. Para outros, numa frase ouvida ou simplesmente numa desconexão, quando na prática de seu esporte favorito. Conta-se que quando Einstein ficava frustrado durante os estudos do projeto de relatividade geral, ela pegava seu violino e tocava Mozart até conseguir se reconectar com aquilo que ele chamava de harmonia das esferas.  

Ao aparecer um insight, em geral sentimos aquela comichão, uma sensação de urgência para colocar a ideia em prática imediatamente. Seja para aplicar uma sacada que pode valer um salto na carreira (na correção de um erro, melhoria em um processo, a criação de um produto ou serviço) ou mesmo empreender na criação de um negócio milionário. Isso, com certeza, já aconteceu com você.

Ambiente inovador

Para Isaacson, autor do livro Os inovadores, a inovação ocorre quando sementes maduras caem em solo fértil. O ar que respiramos dentro do ambiente de trabalho pode conspirar contra ou a favor da criatividade. Em outras palavras, ter um ambiente não somente físico, mas envolto de pessoas colaborativas e empreendedoras, com desejo de fazer diferente, influi positivamente no processo de inovação.

Um ambiente refratário ao novo está diretamente relacionado ao baixo índice de inovação. Faz com que muitas excelentes ideias nem mesmo cheguem a ser compartilhadas com chefes, companheiros de trabalho ou amigos. São simplesmente esquecidas e raramente levadas a cabo. Perdem a importância frente às demandas, prioridades e urgências do dia a dia.

Esse ambiente é caracterizado pela incapacidade de as empresas lidarem com projetos discrepantes de seu core, pela falta de orçamento, de pessoal, de lideranças inovadoras, com metas demais e tempo de menos. Para aprofundar no assunto, recomendo a leitura do post “Quer inovar? Acabe com o departamento de inovação” (role a barra) onde discutimos o equívoco de se tratar a inovação como um setor ou departamento.

Criatividade – sozinha, ela não é suficiente

Definitivamente, a era do gênio solitário acabou. A história tem mostrado que avanços não têm apenas uma causa, mas são resultado da sinergia entre capacidades, ideias e necessidades que coincidiram em vários lugares. De fato, essas “coincidências” não são raras. Ocorreram com o desenvolvimento computacional, quando pesquisadores em diferentes lugares do mundo, usando tecnologias diferenciadas, criaram sistemas semelhantes ou complementares e o mesmo aconteceu no desenvolvimento de estudos que originaram a teoria da relatividade.

A maior parte das grandes inovações da era digital nasceu de um efeito combinado da criatividade de indivíduos com equipes que souberam como implementar as ideias deles. Em geral, as boas ideias, quando compartilhadas, são trabalhadas, recompostas, recombinadas. Esse processo de refinamento acaba por testar a eficiência da ideia e torná-la melhor. Esse é um dos grandes diferenciais usados por startups na criação de aplicativos para smartphones, os populares app’s.

Uma ideia é apenas o ponto de partida na jornada da inovação. Levar adiante uma ideia no labirinto de refinamentos e aprovações, até a ideia se transformar em um projeto, ser desenvolvido, testado e, se for o caso, chegar ao mercado, requer habilidade de gerenciamento, uma boa estratégia e muito jogo de cintura. O valor de uma inovação está diretamente ligado ao esforço de seu desenvolvimento.

Concretizar uma ideia requer articulação, organização, orçamento, venda interna e externa da ideia, entre outros. Uma frase atribuída a Thomas Edison ficou popular nos manuais de gestão no século passado e até hoje é repetida à exaustão: “talento é 1% de inspiração e 99% de transpiração.” Essa frase faz todo o sentido para o processo de desenvolvimento da inovação.

Propósito – a morte da “caixa de sugestões”

É preciso estar claro para as pessoas quais são os objetivos estratégicos da organização, para qual direção o mercado está seguindo e qual a proposta de valor que a empresa quer efetivamente entregar ao cliente. As ideias não precisam e nem devem ser convergentes, mas é importante se atentar para o que de fato é relevante e sinalizar o que pode melhorado, dando às pessoas instrumentos flexíveis e colaborativos para proporem ideias e potenciais soluções.

Um ambiente inovador conspira para as pessoas se envolverem e quererem inovar. Mas não há lógica em um bando de pessoas cheias de ideias, cada uma andando em uma direção, muitas vezes desenvolvendo projetos similares e sem nenhuma conexão com os objetivos estratégicos da organização.

Aliás, foi-se o tempo das antiquadas e estáticas caixas de sugestões. Essas caixas foram (e ainda são) usadas para que as pessoas colocassem ideias visando melhorias, mas sem nenhum direcionamento. Como o processo não inclui um foco nas sugestões e uma governança colaborativa acaba por criar descrédito e frustração, pois surgem milhares de ideias que sequer são analisadas, não há feedback para os autores e tampouco implementação.

Existem inovações de diversas naturezas. As inovações incrementais podem ser importantes para melhorar produtos, ampliar mercados, otimizar processos, reduzir custos, entre outros. Por outro lado, muitas empresas estão se dando conta de que precisam competir em diferentes fronts. Todos os dias surgem startups propondo novas maneiras – via de regra mais simples e avançadas – de fazer as coisas. As atividades que fazem parte do seu core devem ser mantidas – embora tenham que ser questionadas de tempos em tempos – mas os gestores devem encorajar e fomentar inovações radicais, que possam confrontar ameaças de parceiros, concorrentes e de produtos ou serviços substitutos.

Exemplo? O UBER usou os avanços do digital e, através de um aplicativo para smartphone, lançou um modelo de negócio que conecta pessoas que precisam se deslocar com motoristas particulares que podem realizar esta tarefa. Tudo isso, com regras claras para ambos. E isso trouxe benefícios para a sociedade: criação de milhares de postos de trabalho, melhoria da qualidade do serviço ao cliente e da mobilidade urbana. O que aconteceu? Presenciamos o aparecimento de um negócio disruptivo, que colocou o negócio táxi em xeque e pegou governos literalmente com as calças nas mãos, pois não havia nenhuma convenção ou lei preparada para este tipo de serviço. A uberização, neologismo para definir modelos de negócios inovadores e disruptivos, vem hoje amedrontando negócios existentes e porque não também os governos.

A importância da colaboração e da articulação

Entender o que significa colaboração passa a ser a chave na constituição de ambientes inovadores. Temos consciência que as pessoas são únicas, tendo comportamentos diferentes frente ao mesmo problema ou desafio. Entre as diversas explicações para isso, podemos citar o comportamento do cérebro – dividido em hemisfério direito (mais emocional) e esquerdo (mais racional e analítico) – e a personalidade, muitas vezes influenciada pelo meio onde o indivíduo vive ou foi criado.

O processo colaborativo, que vai depender também de uma comunicação eficaz, inicia-se na integração das pessoas com foco no desenvolvimento ou mesmo na solução de problemas. A formação de grupos com pessoas vindas de outras realidades (inclusive externas à organização – inovação aberta ou open innovation) possibilita a criação de grupos multidisciplinares, reunindo saberes e complexidades que podem tornar as ideias originais muito mais poderosas. Hoje, com a evolução tecnológica, ficou mais fácil juntar forças com universidades, parceiros, fornecedores e clientes não só para articular projetos inovadores, mas também na busca por soluções para problemas comuns. A inovação aberta propicia que culturas e comportamentos diferentes enriqueçam a discussão, inserindo elementos novos que podem ser decisivos para transformar dificuldades em grandes oportunidades. Um exemplo de colaboração e inovação aberta, já utilizado há bastante tempo, são as plataformas de software livre.

Dentro das organizações, é necessário criar condições para a união de cérebros entre unidades de negócios, setores e áreas para que se produzam inovações que melhorem ou até mesmo revolucionem a empresa.

Mas, isso definitivamente não é possível sem a horizontalização da gestão ou, pelo menos, sem a diminuição do abismo entre a operação e o board, que impede a flexibilidade e a praticidade, desde a ideação até a execução de projetos.

Este desafio é objeto de um profundo estudo realizado por nós que originou a Plataforma KER, um modelo de gestão que propõe a criação de uma cultura da inovação (ambiente inovador) através da inclusão e colaboração.

O fracasso – ele pode e vai inevitavelmente acontecer

Um dos mitos do processo de inovação é achar que todas as ideias podem dar certo e isso é um engano. Quando perguntado se falhou 10 mil vezes no desenvolvimento da lâmpada, Thomas Edison respondeu: “I haven’t failed. I just found 10,000 ways that won’t work.” (“Eu não fracassei. Só descobri 10 mil maneiras que não darão certo.”) 

Em minha opinião, não existem ideias ruins. Todas as ideias são boas e relevantes. Existem casos em que uma ideia dita “ruim” provoca insights e com novas combinações pode transformar-se numa grande solução ou até mesmo num grande negócio.

Para terminar, embora à primeira vista inovação pareça ser consequência certa da aquisição de bons profissionais e de recursos tecnológicos, não se engane: inovar não é coisa trivial. Não existem fórmulas mágicas. Inovação no mundo dos negócios significa “mais dinheiro no caixa”, mas nunca devemos perder de vista o objetivo de melhorar a experiência do cliente (interno ou externo), pois isso será o fator primordial para o sucesso de uma nova ideia e da própria empresa.

O entendimento e uso dos aspectos citados somados a um trabalho dedicado e focado implicará não somente na geração de inovações pontuais, mas na criação de uma cultura da inovação.

Aqui você receberá nossos artigos e convites para eventos.

Tags: Inovação, colaboração, criatividade, pensamento inovador, inovação incremental, inovação radical, ambiente inovador, plataforma KER, caixa de sugestões, tecnologia

Especialista em Inovação, Design Thinking e Empreendedorismo pelo Babson Executive and Enterprise Education  nos Estados Unidos. CEO da Carrusca Innovation.  Atuou na IBM BRASIL e IBM EUA. É diretor de BPM & ECM da SUCESU MINAS, consultor da Fundação Getúlio Vargas, do SEBRAE e Professor do IBMEC.

É o Idealizador do Plataforma KER, um novo modelo de Gestão  com foco na criação de uma cultura da inovação através de uma abordagem inclusiva e colaborativa. Modelo certificado como propriedade intelectual pelo Ministério da  Cultura.